CONTO POLÍTICO: A Morte do Bom Prefeito



Um dia fiz uma viagem, daquelas que não estamos muito a fim de ir, saí do meu belo Estado e adentrei na Bahia via Piauí, fiquei maravilhando com a beleza do nosso Brasil, quanta riqueza em meio a tanta gente necessitada. Quanto mais quilômetros percorridos, mais evidente os contrastes naturais e sociais a beira das rodovias. Estávamos em excursão em pleno dia de eleição para presidente do Brasil. Logo nas primeiras horas do dia, o motorista do ônibus estaciona e nos alerta de que teríamos que justificar nosso voto e que seria ali mesmo naquele lugar. Sem nenhum protesto, descemos na praça principal, perto da igreja onde havia uma escola com uma seção eleitoral, que nos livraria da responsabilidade do voto. 


O lugar estava um burburinho só, típico daqueles dias de votação nas cidades pequenas. Tudo transcorria em paz, o povo só falava e votava no presidente operário e nordestino. Quando de repente o alto-falante da igreja anunciou que um triste fato acontecera naquele momento: o prefeito do município havia falecido de causas naturais. Corremos então naquele instante para frente da casa do falecido, chegando lá, uma multidão já se aglomerava, quando saiu na porta a Primeira Dama aos berros, dizendo: 

- Aqui ninguém entra, e se o corpo desse vagabundo aparecer também não entra, vão beber esse defunto em outro lugar! 

A população surpresa não entende nada. Quando vem, a notícia de que o nobre gestor municipal havia morrido em plena atividade, desenvolvendo uma dura batalha carnal, no cabaré do pinga pus. O bom político não suportou a pressão, sucumbiu diante da técnica apurada da quenga mais afamada da regional. Diziam por lá que foi overdose de “Viagra do Paraguai”, o certo mesmo é que o homem estava durinho no quarto alugado por três reais para o encontro libidinoso. A notícia a essas alturas já espalhara por todo lugar, o corpo que estava sob guarda de alguns babões de plantão foi depositado em uma fina rede de garimpeiro; começaria ali uma lúdica peregrinação. Como em sua própria casa não poderia entrar, decidiu-se então levar o corpo para a igreja matriz, chegando estavam as portas fechadas e o vigário foi logo dizendo: 

- Aqui esse presunto num entra não! Nunca pagou se quer uma conta de luz e ainda mandou cortar a água da paróquia, sem falar que lugar de bruxo é na fogueira. 

Com as portas fechadas na cara, a comitiva fúnebre toca no rumo da câmara municipal, lá os vereadores até que aceitaram sob força de alguns protestos permitiram a entrada; porém, quando se abrem os cadeados do salão, todo o teto do local vem abaixo, por pouco não aconteceria um enterro coletivo. O presidente da câmara meio afobado não espera nem baixar a poeira e vai logo despejando: 

- Isso só pode ser castigo, pois quando o homem que está dentro desse caixão foi vereador e presidente da câmara, desviou os recursos da reforma e ampliação, até hoje as contas de seu mandato estão no TCE esperando aprovação. 

Passado o susto e muita decepção, segue a pisada pelas ruas esburacadas, procurando uma estação: prefeitura não existia, era uma casa alugada sem janela e sem portão; quadra de esportes nem pensar faltavam cimento e iluminação; depois de muito andar atrás de um local para o velório começar, eis que surge o candidato da oposição oferecendo sua casa para a sentinela acontecer. Lá do fundo grita um cabo eleitoral: 

- Êpa! Pêra lá, não é por que o Homem morreu que nós vamos nos misturar! E pode tocar a procissão. 

Já sem muita esperança, os correligionários do finado já estavam virando motivo de piada pela cidade, em toda rua que passavam um coro sussurrado era ouvido: 

- Bem feito ladrão! Quando era pobre e não tinha nada era gente boa, quando chegou ao poder: “o povo que se lasque”. 

Quando já estava escurecendo, e o repudiado falecido começara a se putrefazer, descobre-se que o infeliz não era filho daquela terra, nem mesmo tinha título de cidadão – espanto geral, nessas alturas o povo festejava o novo presidente. 

Estávamos prestes a embarcar e seguir nossa viagem quando ouvimos o barulho do “gavetão” de um ônibus interestadual com origens de São Paulo. Lá fora alguém dizia: 

- Leva essa mercadoria sem nota para o Maranhão, deixa em Peritoró, de lá, quem quiser leve para Pedreiras

++++++++++++++FIM++++++++++++++

MORAL DA ESTÓRIA: Não existe prefeito bom, existe aquele que se faz de morto.
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