Desde junho
do ano passado o país passa por um clima de comoção social que iniciou com
protestos isolados contra o aumento de passagens em ônibus urbanos e se
disseminou por todo o país num movimento semi-revolucionário com uma pauta
enorme de reivindicações, que no fundo exige basicamente justiça social e
seriedade no trato da coisa pública pelos gestores eleitos e/ou indicados/nomeados
para tal. Das passeatas e manifestações de ruas pacíficas e legítimas,
desaguamos nos black blocks e
rolezinhos. Da seriedade das manifestações iniciais descambou-se para o
vandalismo puro e simples.
Como o
clamor das ruas não foi plenamente entendido pelos nossos governantes,
especialmente por nossa chefa máxima, a intolerância tomou conta paulatinamente
de grande parte de nossa população pelo fato da ausência de resultados
imediatos das reivindicações. Um clima de guerra civil toma conta do país. E o
país vive uma crise institucional, praticamente.
Nesse bojo há algo que muito me preocupa, que é o fato do justiçamento, isto
é, da população, por não confiar nas providências e poderes do Estado, assumir
a responsabilidade de fazer justiça com as próprias mãos. Situação extremamente
perigosa. De tanto presenciarmos e sofrermos barbaridades, desesperados, estamos
pensando em nos tornar todos uns bárbaros. Esse é o maior risco.
Mas será se essa postura é correta e eficaz?
A Bíblia diz em Mateus 24:12 : “E,
por se multiplicar a iniqüidade, o amor de muitos esfriará”. Já nosso grande
Ruy Barbosa dizia no início de 1900
que: “De tanto ver triunfar as nulidades,
de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto
ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da
virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”. E poderíamos
completar: “e a querer fazer da força e da violência a solução dos males que o
ameaça e angustia”.
Permeiam os
noticiários fatos de justiçamentos e linchamentos. Pessoas defendendo nas redes
sociais a morte e o espancamento de delinqüentes, inclusive menores de idade.
Aqui em nossa pequena Pedreiras isso já ocorre. Não. Não acredito que seja
fazendo justiça com as próprias mãos que resolveremos o problema da
criminalidade em nosso país. É triste e deprimente presenciar o estado marginal
parecer dominar o Estado oficial. Mas a violência só leva a mais violência. A
abordagem adequada para a transformação é o amor, a educação, a formação, a
informação, a consolidação de valores sociais, pessoais, espirituais e morais
retos e inclusivos. Precisamos é de mais inclusão social. Nossas instituições é
que estão fracas e não conseguem mais dar resposta às demandas sociais. O
problema é sociologicamente mais profundo e complexo do que um pensamento
superficial de revolta consegue entender.
E o que
percebo mais é que a intolerância é mais com a marginalidade pobre. Defendem a
morte de pobres e são tolerantes com os bandidos ricos. Pois os criminosos que
circulam com bom trânsito social e detêm algum poder econômico que os destacam
socialmente são até bajulados e adulados por esses que defendem o justiçamento
de marginais das periferias. O jargão “bandido bom é bandido morto” só se
aplica ao bandido pobre. Essa é a grande verdade.
Do que dizer do pior tipo de bandido que é aquele que “mata com a caneta” desviando milhões de
reais de recursos públicos da saúde, da educação e do saneamento básico, e que
faz vítimas aos milhares nesse país? Estes estão em gabinetes refrigerados,
andam em bons carrões, comem em bons restaurantes e freqüentam excelentes lounges. Dentro do restaurante que um
desses almoça, alguns o adulam, mesmo sabendo ser ele um grande ladrão, prontos
para defender a morte do flanelinha que lá fora vigia o carro se esse roubar
seu celular. Convivem placidamente com componentes de máfias de roubos de
carros, cargas, cartões do INSS, golpes cibernéticos e grandes traficantes de
drogas. Hipocrisia!
Trabalhei 02
anos num presídio. Nunca vi lá dentro um preso de classe média alta ou um rico.
Num país sem justiça social como o nosso, pena de morte só matará pobres e criminalizar
menores só condenará delinqüentes da periferia. Nesse país morrem mais crianças
por infestação de lombrigas do que de AIDS. Absurdo! E onde existe pena de
morte e e criminalização do menor delinqüente, as estatísticas demonstram que
isso não diminuiu a criminalidade.Temos que entender que todos nós somos
responsáveis por isso. E nossos pequenos delitos contribuem para esse grande
caos quando subornamos o guarda para dirigir sem habilitação, quando compramos
um carro FINAN ou um CD pirata, quando dirigimos embriagados, quando
estacionamos em cima da faixa de pedestre, quando sonegamos impostos, quando
ultrapassamos o sinal vermelho, quando compramos o diploma de segundo grau ou a
vaga do filho na faculdade, quando votamos em pessoas sabidamente delinqüentes
da política etc.
Não defendo
o crime nem o criminoso. E acredito que não devemos amar o pecado, mas temos a
obrigação de amar o pecador. Assim Cristo ensinou. E me indigno com católicos
de terço na mão e pentecostais falando em línguas estranhas defendendo o ódio e
a violência. Quanto a isso a Bíblia diz em Provérbios 17:13: “Quanto àquele que paga o bem com o mal, não se apartará o mal da sua casa”. E em
Romanos 8:38-39 Paulo afirma: “Porque
estou certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados,
nem as potestades, nem o presente, nem o porvir. Nem a altura, nem a
profundidade, nem alguma outra coisa nos poderá separar do amor de Deus, que
está em Cristo Jesus nosso Senhor”. Também em Romanos 12:9, ele também diz:
“Aborrecei o mal e apegai-vos ao bem”. Se nós cristãos devemos imitar a Cristo,
e Cristo nos ensina a amar, porque nós somos incapazes de fazê-lo.
Cristo
ensina a suportar, acolher e amar ao próximo em seu erro e dificuldade. E se
Deus que é Deus ama o marginal, quem somos nós meros humanos cheios de erros e
falhas também para sair por aí condenando? Já dizia Mário Ottoboni que “todo
homem é maior que seu erro”. Portanto, ninguém é irrecuperável. O apóstolo
Paulo tinha como hobby matar cristãos; depois passou a salvá-los.
E não pensem
que é porque ninguém nunca me roubou, nunca matou um familiar meu ou nunca
estuprou uma filha minha que digo isso. Não! Eu falo assim porque vivo e
acredito assim!!!
Como dizia
nosso velho e inesquecível Mahatma Gandhi: “de olho por olho e dente por dente,
o mundo terminará cego e banguela...” Acredito nisso!
Allan Roberto Costa Silva, médico, ex-Vereador-Presidente da Câmara Municipal de Pedreiras, membro
da Academia Pedreirense de Letras-APL e da Associação dos Poetas e Escritores
de Pedreiras-APOESP. E-mails: arcs.rob@hotmail.com ou allanrcs@bol.com.br
Texto maestral. Argumentação inequívoca. Visão sublime.
ResponderExcluirParabéns!
Nao se trata de menores ou de maiores,de mais ricos ou mais pobres,se trata sim de nossas viadas da nossa seguranca,respeito todas as opinioes,no entanto gostaria de saber se esses q defendem teriam coragem de falar para um pai de familia q perdeu seu filho,q teve sua filha violentada,se defenderiam os menores ou maiores se fosse com um parente seu,e o q dizer do trabalhador q acorda de madrugada todos os dias pra ganhar o pao e da algo melhor pra sua familia q nao retorna pra casa e quando volta tem seus bens roubados,bens conquistados com muito suor,e facil defender vagabundo,e facil ser certinho,mais a verdade e q muitos q defendem pensam da mesma forma q nos pensamos,e deixo claro,q nao me agrada nao a ideia de linchar,de matar,seja de menor ou maior,mais esperar a justica de quem?nos e q temos q nos defender,nao me agrada,mais apoio,chega de impunidade.
ResponderExcluirDireitos humanos são para humanos direitos . O adolescente com 16 anos é capaz de decidir o futuro de um país inteiro através do voto mais não é capaz de responder criminalmente pelos seus delitos. Ô justiça cega desgraçada viu.
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